quarta-feira, 1 de setembro de 2010

O julgamento e o auto-da-fé

A História demonstra que os inquisidores torturavam os acusados de heresia a fim de extrair confissões. No esforço de diminuir a culpa da Inquisição, comentaristas católicos têm escrito que, naquele tempo, a tortura era comum até nos tribunais seculares. Mas será que isso justifica o uso de tortura por ministros que afirmavam ser representantes de Cristo? Não deveriam eles ter demonstrado a mesma compaixão que Cristo mostrou por seus inimigos? Para encarar esse assunto de modo objetivo, poderíamos refletir sobre a seguinte pergunta: será que Cristo Jesus teria torturado os que não concordassem com os seus ensinos? Jesus disse: “Continuai a amar os vossos inimigos, a fazer o bem aos que vos odeiam.” — Lucas 6:27.

A Inquisição não garantia justiça aos acusados. Na prática, o inquisidor tinha poderes ilimitados. “Suspeitas, acusações e até boatos eram suficientes para o inquisidor intimar uma pessoa a comparecer perante ele.” (Enciclopedia Cattolica) Italo Mereu, historiador jurídico, afirma que foi a própria hierarquia católica que concebeu e adotou o sistema inquisitorial de justiça, abandonando o antigo sistema acusatório fundado pelos romanos. A lei romana exigia que o acusador provasse suas alegações. Se houvesse qualquer dúvida, era melhor absolver do que correr o risco de condenar um inocente. A hierarquia católica substituiu esse princípio fundamental pela idéia de que suspeita pressupõe culpa, e era o acusado quem tinha de demonstrar sua inocência. O nome das testemunhas de acusação (os informantes) era mantido em sigilo, e o advogado de defesa, quando havia um, se arriscava a ser desonrado e a perder seu cargo se defendesse com êxito um suposto herege. Em resultado disso, admite a Enciclopedia Cattolica, “os acusados ficavam virtualmente sem defesa. Tudo que o advogado podia fazer era aconselhar o culpado a confessar”.

O julgamento acabava num auto-da-fé (literalmente: “ato de fé”). O que era isso? Desenhos da época mostram que os infelizes acusados de heresia se tornavam vítimas de um espetáculo horrível. O Dizionario Ecclesiastico define o auto-da-fé como “ato público de reconciliação realizado pelos hereges condenados e arrependidos” depois da leitura de sua condenação.

A condenação e a execução dos hereges eram adiadas de modo que várias delas pudessem ser juntadas num único espetáculo horrendo, duas ou mais vezes por ano. Uma longa procissão de hereges passava diante dos observadores, que participavam de tudo isso com um misto de horror e fascínio sádico. Os condenados tinham de subir num cadafalso no meio de uma praça grande, e suas sentenças eram lidas em voz alta. Os que renegassem, isto é, renunciassem às doutrinas heréticas, eram poupados da excomunhão e sentenciados a várias punições, incluindo prisão perpétua. Os que não renegassem, mas que no último momento se confessassem com um sacerdote, eram entregues às autoridades civis para serem estrangulados, enforcados ou decapitados, e depois queimados. Os impenitentes eram queimados vivos. A execução propriamente dita acontecia em outra ocasião, após outro espetáculo público.

A atividade da Inquisição Romana era mantida em sigilo absoluto. Até hoje, os eruditos não podem consultar seus arquivos. Porém, pesquisas pacientes revelaram vários documentos jurídicos de tribunais romanos. O que eles nos contam?

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